quarta-feira, 28 de abril de 2010

DIREITO DA INTEGRAÇÃO E DIREITO COMUNITÁRIO, MODELOS EUROPEUS E AMERICANOS DE INTEGRAÇÃO.

“Nossa união não é de Estados, senão de pessoas.”
Jean Monnet



RESUMO


O regionalismo é um dos traços caracterizadores da Ordem Mundial Contemporânea. Desde meados do século passado, diversos modelos de integração foram experienciados e diferentes blocos regionais foram formados, em todos os continentes. A integração, em suas vertentes econômica, política e cultural vem sendo vivenciada como modo de fortalecimento e surgimento de pólos de poder, mormente após o fim da guerra fria e da ordem bipolar.
O presente trabalho tem por objetivo analisar de maneira superficial e introdutória o fortalecimento do referido processo de regionalização como um influente fator de caracterização de uma nova ordem mundial, bem como consistir em estudo inicial do tema para os profissionais das mais diferentes áreas. Serão abordadas brevemente o modelo de integração europeu, algumas iniciativas latino-americanas e a estrutura institucional do MERCOSUL.



TEORIAS DA INTEGRAÇÃO



As primeiras formulações teóricas acerca do fenômeno da integração surgiram na década de 1950, com a emergência das comunidades europeias. A referida década, bem como a posterior foram influenciadas pela abordagem funcionalista. No contexto da bipolaridade, os teóricos focavam-se nos valores ideológicos e nas relações de poder entre as duas potências mundiais. Cabe citar um dos nomes mais influentes do período, Karl Deutsch, para quem a integração servia como meio de suprimir os conflitos entre as nações e, de tal maneira garantir a segurança entre elas. Outro eminente teórico do período, Ernest Haas, definiu integração como : “processo de transferência de lealdade, expectativas e atividades políticas a um novo centro de poder que passa a ter jurisdição sobre o(s) anterior(es), processo este que envolvia a busca do consenso através da persuasão.” O funcionalismo associou-se, portanto, à proliferação de organizações internacionais ocorrida no contexto histórico de sua formulação.
As décadas de 1970 e 1980 foram marcadas pelo neofuncionalismo, sob a ótica da economia política internacional e centrado em temas como a interdependência das nações e a emergência de novos atores não estatais na sociedade internacional competindo com os Estados. A perspectiva doméstica também foi introduzida como determinante no processo de internacionalização. Conforme os grupos internos sejam mais ou menos competitivos em um cenário de integração comercial, arcando com custos ou usufruindo de benefícios com o mesmo, exercem eles pressão sobre os governos, seja a favor da liberalização ou da proteção dos mercados.
Já na década de 90, novos postulados teóricos surgiram, buscando superar a dicotomia interno-externo na explicação da dinâmica de internacionalização, e preocupando-se com temas como o desenvolvimento de estratégias por parte do Estado como forma de conquistar seus interesses e conduzir o processo negociador. Dentro dessa perspectiva, tentou-se explicar e aprimorar as negociações internacionais, através da teoria dos jogos, do behaviorismo e da psicologia social. Algumas das teorias levavam em conta apenas a racionalidade dos negociadores, como se as negociações pudessem encaixar-se em lógicas matemáticas com resultados previsíveis, enquanto outras levavam em conta o aspecto emocional dos negociadores como fator preponderante na condução dos debates.
Nessa perspectiva cabe salientar a análise estrutural da negociação, onde cada ator dispõe de diferentes meios de exercer pressão ou oferecer recompensas, mobilizar recursos e desenvolver táticas de modo a usufruir de maior ou menor poder de barganha nas negociações. Cabe ainda distinguir entre os conceitos de negociação integrativa e distributiva. Esta, ligada a um jogo de soma zero caracteriza-se pelos interesses opostos das partes, onde cada uma busca a preponderância de seus interesses e o resultado reflete a predominância de uma parte em detrimento da outra. Já as negociações integrativas regram-se pelos princípios de solidariedade recíproca, confiança e credibilidade mútua, onde são respeitados os interesses do negociador contraparte e o resultado alcançado implica em ganhos relativos para todas as partes envolvidas. Contudo não existe um tipo puro de negociação, todas são mistas, de modo que se pode falar apenas em negociações predominantemente integrativas ou distributivas.
Outras importantes teorias devem ser mencionadas, como a institucionalista, que estuda a influência das instituições internacionais no comportamento dos Estados, e ainda visões teóricas, como a do sistema-mundo, centrado no capitalismo como modo de expressão de liderança em âmbito regional, a da interdependência não hegemônica, onde o regionalismo associa-se em grande parte ao multilateralismo pós-Guerra Fria, e a dos Estados-região, onde as empresas e os consumidores globais, inseridos em fluxos constantes de investimento e de informação, tornam obsoleto o papel do Estado em tais intermediações.
Apesar de toda a elucubração teórica desenvolvida, é notório que nenhuma teoria se mostrou suficiente para descrever e explicar as complexas interações entre os Estados que se dão de modo diferente de acordo com as realidades históricas, econômicas e culturais de cada região.



BREVES CONSIDERAÇÕES ACERCA DO CONCEITO DE SOBERANIA


Os Tratados de Westfália, de 1648, que puseram fim à Guerra dos Trinta Anos entre Alemanha e França, constituem marco inicial do paradigmático Estado-nação. Tal concepção baseava-se em um conceito de soberania de moldes bodinianos, onde esta seria absoluta, ilimitada e indivisível, ou seja, expressão máxima de poder. Durante muito tempo, os únicos sujeitos de direito internacional público foram os Estados Nacionais, soberanos, que ao relacionarem entre si constituíam a sociedade internacional. A realidade mundial mostra-se, contudo, muito mais complexa do que poderiam imaginar os negociadores do século XVII, que, contudo, estabeleceram os paradigmas que até hoje insistem em regrar as relações internacionais, não obstante ao seu evidente esvaziamento teórico.
Dentro do atual contexto, os teóricos do direito internacional foram obrigados a admitir outros atores internacionais como detentores de personalidade jurídica internacional, ainda que esta se apresente diferentemente em cada um deles. Desse modo há que se considerar as organizações internacionais, de caráter intergovernamental ou não-governamental, e o indivíduo como sujeitos de Direito das Relações Internacionais.
É evidente que a soberania estatal não é absoluta. É ela um princípio geral do direito internacional, que se estende a outro princípio, o da não ingerência em assuntos internos. Estes princípios são reconhecidos pela sociedade internacional e estão elencados em diversos tratados de mesma natureza. Ora, se a soberania de um Estado, depende do reconhecimento de outro, e vice-versa, então nenhum deles é soberano de maneira absoluta. Resta clara a relativização, ou a diluição da soberania. Ademais, cumpre ressaltar que a mesma não é pertencente ao Estado, senão ao povo, de onde emana todo o poder, aquele somente exercendo-o em nome deste. Desse modo, não há que se falar em Estado soberano, senão em povo soberano, que exerce sua soberania por meio de seus representantes legais, não importando, nesse contexto, as dimensões do Estado-nação ou se os referidos representantes são de caráter nacional ou supranacional.
Ainda assim há aqueles que insistem em considerar o Estado como um fim e não um meio de proteção dos interesses do povo. A atual ordem mundial, já em transição, privilegia não o homem, como detentor soberano de seus direitos, mas os diferentes Estados-nação, em sua composição territorial restrita. Dentro desse escopo analisar-se-á a formação de diferentes blocos regionais, onde, em especial na União Europeia, já se observa o fenômeno da supranacionalidade, que há de fazer a transição para um sistema humanista, onde os Estados Nacionais abdicam de parte de sua soberania em razão do bem estar coletivo europeu. Nesse sentido, tal fenômeno não representa o fim de uma soberania já relativizada, mas sim a transferência de sua representação para uma instituição regional.


INTEGRAÇÃO EUROPEIA


Desde antes do fim da segunda guerra mundial, as duras rivalidades entre os Estados Unidos da América e a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas já eram visíveis no âmbito internacional. A própria utilização das bombas nucleares teria sido apenas uma demonstração desnecessária de força, uma vez que o Japão já estava vencido e assinaria sua redenção em pouco tempo. A Europa estava devastada pela guerra e a histórica rivalidade entre França e Alemanha já havida custado incontáveis vidas. A guerra termina e os Estados Unidos lançam o Plano Marshall para reconstrução do continente europeu. Nesse contexto, a França propõe à Alemanha uma forma de evitar o flagelo de um possível conflito futuro, como sempre ocorrera historicamente. Tal estratégia seria a da integração econômica, que se daria tendo em vista os interesses da indústria de aço alemã nos minérios franceses. O intuito era fazer com que as duas economias estivessem tão intimamente ligadas que uma guerra entre os dois países fosse inviável, assegurando assim, a segurança no continente. Ademais, em muito interessava aos Estados Unidos a integração européia, como modo de evitar a proliferação comunista. O país chegou a sugerir, no âmbito da ONU, a criação dos Estados Unidos da Europa. De certa forma observava-se uma inversão nos rumos da história, na medida em que no século XVIII, as treze colônias da América do Norte haviam se deparado com a necessidade de se integrarem inicialmente em uma confederação, e posteriormente em uma forma absolutamente nova de organização, então conhecida como federação, com o objetivo de se defender militarmente de um país europeu, e agora era a Europa que enfrentava a necessidade de integrar seus mercados de modo a conseguir manter uma competitividade futura frente à gigantesca economia norte americana que então já se tornava hegemônica.
Desde 1947, a Bélgica, a Holanda e Luxemburgo formavam um mercado comum que provara ser muito bem sucedido, conhecido como BENELUX. Tem-se o marco inicial da história da Comunidade Europeia quando, os três supracitados países e a Itália aderem à iniciativa franco-alemã. Em 1951 é assinado em Paris, um tratado que estabelece a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço (CECA), então formada pelos seis referidos países. O tratado entra em vigor em 1952 e um mercado comum é aberto em 1953. Quatro anos depois é assinado o Tratado de Roma, que cria a Comunidade Econômica Europeia (CEE) e a Comunidade Europeia de Energia Atômica ( CEEA, também conhecida por EURATOM). O Tratado seguia as diretrizes institucionais do anterior, criando uma Assembleia, um Conselho, uma Comissão e um Tribunal de Justiça. Importante notar o caráter supranacional da comunidade que a acompanha desde a sua criação. Observou-se então, com a entrada em vigor desses dois tratados, a criação de três comunidades distintas das quais faziam parte os mesmos seis países, e dentre as quais a mais importante era a CEE. Já se observava a existência de livre circulação de pessoas, bens e capitais. A principal falha institucional, apontada desde o início fora a criação de órgãos equivalentes e paralelos, com as mesmas quatro instituições básicas. Tal correção foi feita pela unificação dos executivos das três comunidades, em 1965, pelo Tratado de Bruxelas. Assim, as duas Comissões e os três Conselhos de Ministros foram substituídos por uma única Comissão e um único Conselho. As três comunidades foram administrativamente unificadas pelo tratado em questão, contudo, os tratados continuavam separados, sendo fundidos apenas com o Tratado de União, de 1992.
O Ato Único Europeu de 1986, celebrado em Luxemburgo modificou e completou os tratados de Paris e Roma, bem como reformou instituições, ampliou competências e consagrou a cooperação política entre os membros na área externa. Novos membros aderiram à comunidade europeia em 1973, 1981, 1986, 1995, totalizando atualmente 27 membros.
A União Europeia é estabelecida de fato pelo Tratado de Maastricht, de 1992, configurando-se numa união econômico-monetária, que zela pela segurança comum, bem como trata da política externa, negociada em bloco, e da cooperação no campo da justiça e dos assuntos internos. Possui como princípios fundamentais a democracia, a liberdade econômica , o primado do direito comunitário e a pós-nacionalidade .
As principais instituições que compõe a comunidade europeia são o Conselho Europeu, que fornece diretrizes políticas e expressa a posição comum nas questões de relações exteriores; o Parlamento, cujos membros são eleitos por voto direto e universal, representando os povos, não os Estados ; o Conselho da União Europeia, que não se confunde com o Conselho Europeu, que é o verdadeiro centro de gravidade institucional comunitário, dotado de poder de decisão, formado pelos representantes dos Estados; a Comissão Europeia, órgão realmente supranacional na parte executiva, formado por 17 membros que representam a comunidade, completamente independentes dos Estados-membros; e uma Corte de Justiça, permanente com jurisdição própria e competências exclusivas. Dentre outros há ainda um Tribunal de Contas, um Comitê das Regiões, um Banco Central Europeu e o Instituto Monetário Europeu. Cabe ressaltar que os membros das instituições são funcionários internacionais, sem qualquer tipo de vínculo com o Estado de origem. Não obstante a isso, são observadas certas distribuições geográficas. Tal critério de contratação de funcionários, aliado ao processo de decisão por maioria e tendo em vista a existência de órgãos supranacionais como é o caso da Comissão, contribuíram para a emergência de um modelo de integração ainda não definido pela ciência política, onde os Estados-nação abrem mão de parte de sua soberania em prol de uma integração que os beneficia, política, cultural e economicamente. A soberania é, portanto, diluída, relativizada, parecendo caminhar para uma federação, contudo, os estados nacionais mantêm em certa medida seu caráter soberano. Cumpre aqui salientar que a soberania de fato é pertencente ao povo, não ao Estado, desse modo, a questão não engloba transferência da mesma por parte dos Estados-membros, senão de competências para exercê-la em nome do povo europeu.





INTEGRAÇÃO DA AMÉRICA LATINA



Em 1958, a CEPAL publicou em seu relatório anual a recomendação de criação de uma zona de livre comércio na América Latina, que por meio de substituição de importações e liberalizações comerciais internas fortalecesse as economias latinas. Como resultado do referido estudo 11 países assinaram em Montevidéu, em 1960, tratado que instituía a Área Latino Americana de Livre Comércio (ALALC), que previa a criação de um mercado comum entre os Estados-partes no prazo máximo de 12 anos. Contudo, a década de sessenta na América Latina revelou-se de extrema dificuldade no que tange ao processo de integração, visto que emergiram diversos governos militares no continente. Esse tipo de governo autoritário repudia qualquer tipo de tendência integracionista, por entender que o país perde sua soberania, e consequentemente, sua centralidade e seu poder, ao engendra-se nesse tipo de processo. De tal modo, as negociações no âmbito da ALALC foram em muito prejudicadas e paralisadas, de sorte que em 1972, quando expiraria o prazo máximo estabelecido, acordou-se em estendê-lo por mais oito anos.
Em 1980 é assinado um segundo tratado de Montevidéu que substitui a ALALC pela Associação Latino Americana de Integração (ALADI), esta visando à criação de um mercado comum latino americano, porém dessa vez sem prazo determinado para a sua concretização, de sorte a não frustrar qualquer tipo de expectativa. O tratado prevê a cláusula de nação mais favorecida e os princípios da gradualidade e flexibilidade. Favorece ainda, o estabelecimento de acordos bilaterais entre as partes, como forma de desenvolver a integração econômica que deverá posteriormente se estender aos demais membros da ALADI. Desta são membros os mesmos 11 países que constituíam a ALALC.



PROJETOS DE INTEGRAÇÃO REGIONAL NA AMÉRICA LATINA




Diferentes projetos foram desenvolvidos nas últimas décadas objetivando a integração regional no continente latino americano. Passa-se agora a mencionar alguns dos referidos projetos.
A Comunidade Andina de Nações foi estabelecida pelo Acordo de Cartagena, em 1969, tendo sido conhecida até 1996 por Pacto Andino. Era formado por Bolívia, Colômbia, Peru, Equador, Venezuela e Chile, e objetivava o desenvolvimento da região para sua melhor inserção na ALADI. Contudo, o bloco sofre atualmente uma paralisação institucional, devido à saída da Venezuela e à crise da Colômbia com seus vizinhos. O Chile já havia abandonado o bloco em 1977.
O Projeto Mesoamérica é formado pelos países do sudeste mexicano e os sete países do istmo centro americano. Colômbia aderiu à iniciativa em 2006. Objetiva o desenvolvimento econômico com respeito à diversidade cultural e étnica. O Sistema Econômico latino-americano foi outro mecanismo, crido em 1975, composto por 24 países membros, que seria uma versão renovada do nacionalismo americano. Em 1968 é criado o CARIFTA, posteriormente CARICOM (1972), mercado comum que objetivava a coordenação da política exterior das partes e a integração econômica.
Cabe ainda citar a Alternativa Bolivariana para a América Latina e Caribe, proposta pelo presidente venezuelano Hugo Chávez, buscando o reforço da autodeterminação e da soberania dos povos, em um modelo de integração que representava a antítese do Consenso de Washington, sendo, portanto, contrário às políticas econômicas implantadas no fim do século passado pelos EUA e por organismos internacionais como o Banco Mundial. Tal mecanismo é formado por Cuba, Venezuela, Bolívia, Honduras e Nicarágua, pretendendo ser um modelo desenvolvimento independente, baseado na complementaridade econômica regional.
Outros projetos como o Mercado Comum Centro Americano e a Área de Livre Comércio Sul- Americana (Alcsa), esta, proposta unilateralmente pelo Brasil na década de 1990, lamentavelmente não prosperaram. Todavia, há ainda um projeto no qual grandes esperanças estão depositadas, é ele a UNASUL, União das Nações Sul Americanas, antiga CASA, Comunidade Sul Americana de Nações. O tratado constitutivo da UNASUL foi assinado em Brasília, em 23 de maio de 2008 e o mecanismo comporta 12 países do continente, empenhados na construção de um espaço sul-americano integrado política, econômica, social e ambientalmente. Estabelece por bases de apoio as experiências da Comunidade Andina de Nações, e o MERCOSUL. Este constituindo a coluna vertebral na construção de uma América do Sul forte e integrada, pólo de emanação de poder global, na nova ordem mundial em transição.


MERCOSUL


O Mercado Comum do Sul (MERCOSUL) teve sua concretização advinda da aproximação entre as duas maiores potências da America do Sul, quais sejam, Brasil e Argentina. A relação histórica de rivalidade entre os dois países converteu-se em cooperação principalmente a partir da metade da década de 1985, período em que as duas nações viviam situação em muito semelhante, no que tange ao processo de redemocratização, após longo período de ditadura militar, à questão da dívida externa, e à instabilidade econômica vivida por ambos. Já em 1979, a solução da controvérsia Itaipu - Corpus, em muito viabilizou a aproximação dos vizinhos latinos. Outro marco fundamental na referida aproximação bilateral foi a celebração, por Sarney e Alfonsín, da Ata de Iguaçú, em 1985, documento que expressou a intenção de integração entre os dois países, bem como trouxe segurança para o continente na medida em que preconizou a utilização pacífica da tecnologia nuclear, evitando uma possível, dispendiosa e infeliz corrida armamentista na região.
Cabe ainda salientar a solidariedade à Argentina expressa pelo Brasil, por ocasião da Guerra das Malvinas, quando o governo argentino invadiu as ilhas britânicas desde há muito reivindicadas pelo país americano como fazendo parte de seu território. Sabemos todos do desfecho infeliz para nosso vizinho que até os dias de hoje reivindica a posse do referido território.
Um Programa de Integração e Cooperação Econômica (PICE),foi estabelecido pela Ata de Integração Brasileiro - Argentina, em 1986, e posteriormente (1988) os dois países assinaram o Tratado de Integração, Cooperação e Desenvolvimento, prevendo a criação de um espaço comum no prazo de 10 anos. Tal prazo foi encurtado pela metade por ocasião da Ata de Buenos Aires, em 1990, quando Brasil e Argentina previram o estabelecimento de um mercado comum bilateral até 31 de dezembro de 1994. Inicia-se aqui, os debates multilaterais, com a possibilidade de inclusão do Chile e do Uruguai no processo negociador.
É também de 1990 o Acordo de Complementação Econômica n. 14 (ACE14), entre Brasil e Argentina, que traçou as principais diretrizes e estabeleceu os principais órgãos intergovernamentais de integração.

Tratado de Assunção

Celebrado por em 26 de março de 1991 por Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai, prevê o estabelecimento de um mercado comum entre os quatros países até 31 de dezembro de 1994. Cabe observar que o referido prazo foi estabelecido tendo em mente a vontade política de integrar e não aspectos técnicos, uma vez que dificilmente o mercado comum entraria em vigor no prazo estipulado, tendo sido necessário a explicitação do princípio da flexibilidade como base do acordo. O prazo foi estabelecido para um período ainda coincidente com os mandatos dos respectivos presidentes da Argentina e do Brasil, pedras basilares da integração, de modo que a eleição de outro governo não mudasse a política externa dos países, alterando assim, os rumos da integração.
Apesar de alguns autores apontarem o Tratado de Assunção como divisor de águas na Integração latino-americana, ele nada mais foi do que a continuação do processo integracionista já estabelecido por Brasil e Argentina desde meados da década de 80, sendo apenas um aperfeiçoamento para âmbito multilateral do ACE14, representando assim, a continuidade do processo.
O Tratado de Assunção proclama os princípios da gradualidade, flexibilidade e equilíbrio, bem como prevê a livre circulação de bens, serviços e fatores produtivos, o estabelecimento de uma tarifa externa comum, a coordenação de políticas macroeconômicas e o compromisso dos Estados Partes de harmonizar suas legislações nas áreas pertinentes. O MERCOSUL é fundado na reciprocidade de direitos e obrigações entre as partes e seu tratado constituinte prevê a criação de dois órgãos principais, o Conselho do Mercado Comum (CMC), correspondendo ao órgão superior ao qual cabe a tomada de decisões e a condução política do bloco, e o Grupo Mercado Comum (GMC), órgão executivo, que conta com uma Secretaria Administrativa. As decisões dos referidos órgãos são tomadas por consenso, o que significou importante vitória aos interesses dos dois sócios menores, Paraguai e Uruguai, já que assim seriam detentores de poder de veto. Contudo, não obstante a tal sistema, a influência exercida por Brasil e Argentina permanece basilar na tomada de decisões, não sendo tão simples para os outros dois membros vetar uma proposta acordada entre eles, já que estes possuíam enorme poder de barganha nas negociações intra-bloco.
O tratado prevê a possibilidade de adesão de novos membros após cinco anos de sua entrada em vigor e mediante aprovação unânime dos Estados Partes. Prevê ainda reuniões para estruturar o sistema institucional definitivo e o sistema de solução de controvérsias. Os anexos do tratado estabelecem sobre o programa de liberação comercial, o regime geral de origens, o sistema provisório de solução de controvérsias e os subgrupos de trabalho do GMC.


Período de Transição


Correspondente ao período entre a assinatura do Tratado de Assunção, em março de 1991 e 31 de dezembro de 1994, quando deveria entrar em vigor o MERCOSUL. O período foi marcado pela implementação inicial dos compromissos comunitários, bem como por contradições entre os sócios e a ameaça da Argentina de abandonar o bloco em favor de acordos de livre comércio com os Estados Unidos da América e com a Nafta .
Em junho de 1992, em Las Leñas, Argentina, deu-se a II Reunião do Conselho do Mercado Comum, onde foram discutidas questões pertinentes à construção da área de livre comércio e da união aduaneira, como normas de origem, harmonização de políticas, critérios para definição da tarifa externa comum (TEC), políticas contra práticas desleais de comércio, enfim, discussões eminentemente técnicas de caráter econômico-comercial. Foi adotado na reunião o Cronograma de Las Leñas, que conferiu importante operacionalidade ao processo, ao estabelecer metas de esforço comum dos membros e prazos para alcançá-las. Na medida em que se punham em prática as medidas de desgravação tarifária, o comércio intra-bloco cresceu exponencialmente e, mais notadamente entre Brasil e Argentina.
O período, contudo, também foi marcado por uma série de medidas restritivas por parte da Argentina, ao mercado brasileiro, comprometendo assim as negociações, mormente devido às incertezas argentinas acerca do processo de integração. A Argentina estava dividida em dois principais interesses quanto à sua política externa, engendrar-se em uma integração latino-americana, representada operacionalmente pelo MERCOSUL, dentro do qual o Brasil era seu mais importante sócio, ou celebrar tratados bilaterais de livre comércio com os Estados Unidos da América e com a Nafta, o que lhe daria acesso privilegiado ao mercado norte americano. Outrossim, é importante lembrar que em 1990, o presidente Bush havia lançado uma Iniciativa Para as Américas (IPA), que consistia na formação de um regime de livre comércio no continente americano, com um mecanismo de incentivo a investimentos e a convertibilidade das dívidas externas dos países latino-americanos com os Estados Unidos em projetos ambientais. O Chile havia aceito de modo imediato a proposta do governo estadunidense, e outros países cogitavam fazê-lo. O Brasil opusera-se veementemente ao projeto, uma vez que o modelo, da forma como proposto representaria ingerência externa . Nesse contexto, com o risco de dispersão da integração sub-regional do Cone Sul representado pelo IPA e pelo Nafta, o Brasil concentrava esforços para reforçar os laços integrativos com seus vizinhos. Não obstante a tais esforços, a Argentina ameaçava abandonar a integração regional devido aos crescentes déficits comerciais que vinha sofrendo com a liberalização dos mercados, principalmente com relação à balança comercial com o Brasil, que se tornava cada vez mais desfavorável aos argentinos, principalmente em 1991 e 1992. Essa ameaça argentina lhe dava enorme poder de barganha nas negociações, tendo sido obrigado o Brasil a fazer diversas concessões durante o período, de modo a manter seu mais importante sócio engajado no processo integracionista. Contudo a retirada da Argentina da mesa negociadora não parecia provável, devido ao caráter eminentemente técnico que já havia sido imposto pelas negociações. O Brasil volta a ganhar poder de barganha no final de 1993, com a recuperação econômica, consubstanciada pelo Plano Real de 1994. Já em julho de 1993 o Brasil endurece sua posição, não sendo mais condescendente com as medidas unilaterais tomadas pela Argentina , no momento em que esta adotou a alíquota zero para a importação de bens de capital, o que na prática anulava as preferências de que usufruíam as exportações brasileiras. O Itamaraty passou a tratar dos assuntos comerciais, com a possibilidade de impor retaliações à Argentina decorrentes de tais medidas impostas por esta. Entretanto, a controvérsia foi solucionada conciliatoriamente pelo ministro da fazenda Fernando Henrique Cardoso junto com o ministro argentino Domingo Cavallo.
Temas que estiveram na agenda de debates durante o período de transição foram, dentre outros: regime de origem, restrições não-tarifárias, cláusulas de salvaguarda intra-Mercosul, e defesa de concorrência. Dentre estes, apenas o primeiro, onde havia convergência entre os interesses da Argentina e do Brasil pôde ser concluído no referido período.


Desenvolvimento institucional do MERCOSUL


A organização institucional do MERCOSUL se aperfeiçoou a partir do Protocolo de Ouro Preto, assinado em dezembro de 1994, que entraria em vigor em fevereiro de 1996. Foram estabelecidos os seguintes órgãos: Conselho do Mercado Comum (CMC); Grupo Mercado Comum (GMC); Comissão de Comércio do Mercosul (CCM); Comissão Parlamentar Conjunta (CPC); Secretaria Administrativa do Mercosul (SAM); e o Foro Consultivo econômico e Social (FCES), tendo os três primeiros capacidade decisória de natureza intergovernamental, consoante o artigo 2 do referido diploma legal.
O Conselho do Mercado Comum é o órgão superior, formado pelos ministros das relações exteriores e pelos ministros da economia ou equivalentes de cada Estado. Possui a incumbência de conduzir a política de integração do bloco, exercer a titularidade da personalidade jurídica do MERCOSUL, dentre outras atribuições enumeradas no artigo 8 do tratado. Manifesta-se por decisões.
O Grupo Mercado Comum é o órgão executivo do bloco e suas atribuições são explicitadas no artigo 14 do protocolo. Manifesta-se por meio de resoluções. A Comissão de Comércio do Mercosul assiste o GMC e vela pela aplicação dos instrumentos de política comercial comum acordados pelos Estados Partes para o funcionamento da união aduaneira. Manifesta-se através de diretrizes ou propostas. A Comissão Parlamentar Conjunta representa os parlamentos dos Estados Membros, e compete a ela agilizar os procedimentos internos de aplicação das normas emanadas pelos órgãos do MERCOSUL, bem como harmonizar as legislações, nos moldes requeridos pela integração. Manifesta-se por recomendações. O Foro Consultivo Econômico e Social também se manifesta por recomendações, representando os setores econômicos e sociais do bloco. A Secretaria Administrativa do Mercosul funciona dando apoio operacional aos demais órgãos e sua sede é em Montevidéu.
O Protocolo de Ouro Preto também expressa a personalidade jurídica do Mercosul, em seu artigo 34 e reafirma, no artigo 37 a tomada de decisão por consenso e estabelece ainda, no artigo 41 a fontes jurídicas do bloco, quais sejam, o Tratado de Assunção, seus protocolos e instrumentos adicionais, os acordos celebrados em seu âmbito e as Decisões do CMC, as Resoluções do GMC e as Diretrizes da CCM.
Em 09 de dezembro de 2005 foi assinado o Protocolo Constitutivo do Parlamento do Mercosul, este que substitui a Comissão Parlamentar Conjunta e que foi constituído em 06 de dezembro de 2006, como órgão representativo dos interesses dos cidadãos mercosulinos. Os parlamentares são eleitos pelos cidadãos dos Estados Parte por meio de sufrágio universal, direto e secreto. Os primeiros parlamentares foram escolhidos pelos Estados Partes, que buscaram, de modo geral, manter aqueles que já faziam parte da CPC. Contudo, foi-se estabelecido que durante o primeiro período de transição , a população já iria às urnas eleger seus representantes. O povo paraguaio elegeu seus primeiros representantes em 2008, os argentinos e os uruguaios os elegerão em 2011, devido a mudanças em seus calendários eleitorais, e nós brasileiros elegeremos nossos parlamentares no presente ano de 2010. O Parlamento possui como uma de suas funções acelerar o processo de incorporação interna das normas do Mercosul, e observa-se aqui que o que poderia parecer um início de supranacionalidade dentro do bloco, mormente pelas decisões serem tomadas por maioria e não por consenso como nos demais órgãos, em verdade não se realiza, por não possuir o Parlasul poder legislativo. Isso inobstante terá enorme importância na construção de uma identidade mercosulina, e contribuirá sobremaneira com o demorado e gradual processo de integração cultural, cabendo frisar a criação do “Dia do MERCOSUL Cidadão”, para a eleição dos parlamentares de forma simultânea em todos os Estados Partes. Preconiza o Protocolo Constitutivo do Parlasul que tal eleição conjunta deverá se realizar durante o ano de 2014.


Evolução do Sistema de Solução de Controvérsias no MERCOSUL


O Tratado de Assunção previa um sistema simples e provisório para resolver as eventuais controvérsias que surgissem entre os Estados Membros. Estava explicitada no anexo III do tratado e consistia em negociações diretas entre os Estados envolvidos, seguido de mediação do GMC, que poderia convocar grupos de peritos ou especialistas para que em 60 pudesse fazer as recomendações pertinentes. Caso o procedimento não resultasse na solução do conflito, então este seria elevado ao CMC, para que este fizesse as recomendações adequadas. Observa-se, portanto, um sistema vago e lacunoso, onde não há um laudo obrigatório para os Estados, somente recomendações por parte dos órgãos.
Em dezembro de 1991, foi assinado em Brasília, um Protocolo para a Solução de Controvérsias no âmbito do MERCOSUL, que entraria em vigor em abril de 1993. Segundo esse tratado, os Estados teriam 15 dias para resolver a controvérsia mediante negociações diretas, não logrando resultado esse procedimento, o GMC teria 30 dias para manifestar suas recomendações, ainda sendo infrutífero tal procedimento, formar-se-ia um tribunal arbitral ad hoc que após ouvir as partes, emitiria uma decisão obrigatória e inapelável em até dois meses, prorrogáveis por mais 30 dias. Não havendo possibilidade de recurso de apelação as partes poderiam solicitar somente esclarecimentos acerca do laudo emitido pelo tribunal. No caso de descumprimento do laudo por qualquer das partes, a outra estaria autorizada a tomar as devidas medidas compensatórias. O Capítulo V do referido protocolo trata de reclamações de particulares, ou seja, de pessoas físicas ou jurídicas de direito interno. Nesses casos, o reclamante deverá comunicar a Seção Nacional do GMC, que poderá, caso acate o pedido, entrar em contato com a Seção Nacional do GMC do Estado reclamado, para solucionar diretamente a questão , ou elevá-la diretamente ao GMC. Este, se considerar pertinente a reclamação, convocará um grupo de peritos e emitirá uma decisão em 30 dias. Se a decisão constatar a procedência da reclamação contra um Estado-Parte, então qualquer outro membro do MERCOSUL poderá requerer-lhe medidas corretivas ou a anulação das medidas questionadas. Caso tal requerimento não acarrete em resultados, iniciar-se-á o procedimento arbitral acima explanado.
O Protocolo de Ouro Preto modificou parcialmente o Protocolo de Brasília, especialmente no tange à Comissão de Comércio do Mercosul. Com a criação deste órgão, as questões que pertencerem à sua área de competência serão resolvidas da seguinte forma: as reclamações advindas de Estados ou de particulares serão encaminhadas através da Seção Nacional da CCM à CCM, que apreciará o tema em sua próxima reunião, caso não se chegue a um acordo, será convocado um comitê técnico e este encaminhará ao referido órgão, no prazo máximo de 30 dias, um parecer conjunto sobre a matéria, que será novamente apreciada, em busca de um consenso. Caso este não seja alcançado, a CCM encaminhará ao GMC as diferentes alternativas propostas, a fim de que seja tomada uma decisão quanto à matéria. O GMC se manifestará no prazo de 30 dias. Havendo consenso quanto à procedência da reclamação, o Estado reclamado deverá adotar as medidas corretivas pertinentes, caso tais medidas não sejam tomadas, o Estado reclamante poderá recorrer diretamente ao procedimento arbitral exposto no capítulo IV do Protocolo de Brasília.
Em 2002 é assinado o Protocolo de Olivos para a Solução de Controvérsias no Mercosul, tratado que revoga o Protocolo de Brasília e dispões sobre mudanças fundamentais no sistema, mormente com a criação do Tribunal Permanente de Revisão (TPR). No que tange às divergências entre Estados, estes deverão buscar resolvê-las por meio de negociações diretas no prazo máximo de 15 dias, caso não logre resultados tal procedimento, a controvérsia poderá ser opcionalmente submetida às recomendações do GMC, ou encaminhada diretamente ao procedimento arbitral ad hoc. O laudo obrigatório do Tribunal Arbitral será emitido em no máximo 60 dias. Algo inovador até então foi previsto pelo protocolo, a possibilidade de revisão do laudo. Caso tal recurso seja requerido , caberá a controvérsia a apreciação do Tribunal Permanente de Revisão, que poderá confirmar, modificar ou revogar as decisões do Tribunal ad hoc. O laudo do TPR será então inapelável e obrigatório, tendo força de coisa julgada. As partes na controvérsia tem ainda a opção de submeter-se diretamente ao TPR, sem passar pela instância do Tribunal Arbitral ad hoc, ressalte-se, contudo, que neste caso não caberá revisão do laudo. Os Estados possuem também a faculdade de fazer um requerimento de esclarecimento dos laudos, sejam eles de qualquer um dos dois tribunais. Caso um Estado não cumpra o estabelecido em um laudo, a outra parte poderá aplicar medidas compensatórias temporárias, objetivando o cumprimento total do laudo.
Quanto às reclamações de particulares, estes as formalizarão perante a Seção Nacional do GMC do Estado onde tenham residência habitual ou sede de seus negócios. Uma vez ponderada a reclamação, esta será encaminha à Seção Nacional do GMC do Estado a que se atribui a violação, buscando uma solução imediata da controvérsia. Esta não sendo alcançada em 15 dias, o GMC apreciará a matéria, convocando um grupo de especialistas que emitirá um parecer em 30 dias. Sendo este unânime quanto à procedência da reclamação, o Estado reclamante deverá adotar as medidas corretivas, sob pena de submissão da matéria aos supra-referidos tribunais. Ainda que o parecer não seja favorável ao reclamante, poderá ele recorrer aos procedimentos explanados nos capítulos IV a VI do referido protocolo. Cumpre ressaltar que o Protocolo de Olivos prevê a possibilidade de apreciação da controvérsia perante a Organização Mundial do Comércio ou qualquer outro esquema internacional de comércio do qual sejam partes os Estados envolvidos. Contudo, a controvérsia deverá ser encaminhada a um ou outro foro de solução, não podendo ser submetida a mais de um, como já havia sido feito anteriormente pelo Brasil, em questões comerciais com a Argentina. O Protocolo de Olivos foi ligeiramente alterado por um tratado celebrado em 2007 no Rio de Janeiro, de modo a se adequar a adesão de novos membros ao MERCOSUL, tal foi imperativo devido à assinatura, em 2006, do Protocolo de Adesão da República Bolivariana da Venezuela ao MERCOSUL. As adequações referem-se, contudo, a questão como a formação do TPR, não acarretando mudanças significativas no sistema de solução de conflitos já exposto. Importante salientar que a maior complexidade conferida ao sistema fortifica as instituições do MERCOSUL, favorecendo a integração regional.


MERCOSUL: Mercado Comum?


O Tratado de Assunção proclama a criação de um mercado comum entre as partes a 31 de dezembro de 1994. Quinze anos se passaram desde o prazo estipulado e o MERCOSUL está em plena vigência, cada vez mais institucionalizado e complexo. Contudo, será ele um verdadeiro mercado comum?
Para responder a essa pergunta se faz elementar expor brevemente acerca das definições expostas por diversos autores no que tange aos diferentes modelos de integração, levando em conta a maior ou menor proximidade dos vínculos de integração. As etapas de integração segundo Bela Belassa são, em ordem progressiva de intensidade de integração: área de livre comércio, caracterizada pela ausência de quotas ou tarifas; união aduaneira, que, ademais da característica anterior envolve uma tarifa externa comum; mercado comum, englobando os dois caracteres já citados e livre circulação de fatores; união econômica, com o diferencial de existência de uma harmonização de políticas econômicas e a integração econômica geral com a unificação de políticas e instituições econômicas.
Olavo Baptista tece as cinco liberdades imprescindíveis ao mercado comum, quais sejam, livre circulação de mercadorias, liberdade de estabelecimento, livre circulação dos trabalhadores, liberdade de circulação dos capitais e liberdade de concorrência. Estas cinco liberdades são em geral consubstanciadas na expressão: livre circulação de fatores.
Mediante a observação de que não há no MERCOSUL todas as supra-referidas liberdades, não podemos caracterizá-lo como um mercado comum. Cumpre salientar que, como já exposto, o prazo para estabelecimento de tal modelo de integração não foi concebido a partir de uma ótica técnica, senão política. Era patente, inclusive entre as altas autoridades diplomáticas, a inadequação da implementação do modelo ao prazo estipulado. Observa-se, pois, a explicitação da vontade política de integrar, consubstanciando os compromissos acordados.
A aplicação da união aduaneira não se restringe somente à aplicação da TEC, seu mais importante instrumento definidor, mas abarca ainda regulamentos de salvaguardas, regime de defesa contra práticas desleais de comércio, relativas a importações de terceiros países, normas de origem, sistema de valoração aduaneira comum, tratamento de zonas francas, entre outros.
Evoluímos, portanto, gradualmente nas etapas integracionistas, bem como fez a Europa, esta passando pela área de livre comércio, união aduaneira, mercado comum, união econômica para se mostrar hoje uma união econômico-monetária. O MERCOSUL, destarte, ultrapassou a fase de livre comércio, atingindo, em janeiro de 1995, a partir da vigência da tarifa externa comum, o grau de união aduaneira incompleta ou imperfeita. Diz-se incompleta devido à lista de exceções contida na TEC, ademais às outras disciplinas, que não foram estabelecidas apropriadamente ao final do período de transição.
Olavo Baptista , em onda otimista, por ele próprio admitida classifica o MERCOSUL como um mercado comum sui generis. Entretanto, a doutrina reconhece, e pode-se afirmar por certo que, tratando-se de Mercado Comum do Sul, estamos em verdade, nos referindo a uma união aduaneira.
Sem prejuízo da correta definição acima, e levando em conta a inexistência de uniões aduaneiras ou mercados comuns puros, apresentando os diferentes modelos de integração apenas aspectos dos mesmos, o Itamaraty classifica o MERCOSUL como “uma zona de livre comércio e uma união aduaneira em fase de consolidação, com matizes de mercado comum.”



Adesão da Venezuela ao Mercosul



O Protocolo de Adesão da República Bolivariana da Venezuela ao Mercosul foi assinado em Caracas, no dia 04 de julho de 2006. Contudo, para a efetiva incorporação do país ao bloco é necessária a ratificação do referido tratado por todos os parlamentos dos Estados Partes. O Congresso Nacional brasileiro aprovou a adesão no final de 2009. O mesmo já havia sido feito no Uruguai e na Argentina, restando apenas a ratificação por parte do Paraguai para que nosso vizinho sul-americano se torne membro pleno do bloco sub-regional.
A Venezuela possui o terceiro maior PIB da América do Sul e é um país riquíssimo em recursos naturais e minerais. Até pouco tempo atrás, detinha 70% das reservas de petróleo da América do Sul . Com sua adesão o MERCOSUL passa a possuir 70% do território, 3/4 do PIB e 2/3 da população da América do Sul, o que constitui conquista em demasiado auspiciosa a integração do Cone Sul.
Alguns são reticentes quanto a tal adesão alegando que a Venezuela desrespeitaria a cláusula democrática proclamada pelo Protocolo de Ushuaia, no âmbito do Tratado de Assunção. Não obstante às pertinentes críticas a aspectos autoritários do governo de Hugo Chávez, devemos considerar inicialmente que este foi eleito pelo povo e é reconhecido como formalmente democrático, inclusive pela Organização dos Estados Americanos. Outrossim, é de importância elementar o entendimento de que o que está aderindo ao MERCOSUL não é o governo de Chávez, mas sim o Estado venezuelano. Ademais, a referida adesão contribuirá sobremaneira para a solidificação da democracia no país, vez que este terá que respeitar a cláusula democrática preconizada pelo supracitado protocolo, sob pena de expulsão do bloco. Não há, portanto, que se falar em prejuízo ao MERCOSUL com a entrada da Venezuela, somente em benefícios, mesmo porque é evidente que o peso e a influência política, diplomática e econômica dos demais Estados Partes não permitiria jamais qualquer tipo de contágio autoritarista entre eles.
Tendo sido considerados os aspectos acima, resta óbvio que a adesão da Venezuela ao MERCOSUL será de importância fundamental no sentido de fortalecer a integração na América do Sul, tanto em extensão quanto em profundidade. As instituições serão adensadas e se farão mais complexas, tornando cada vez mais forte e preponderante o papel do continente sul-americano no cenário político e econômico mundial.




CONCLUSÃO





Ainda hoje alguns acadêmicos se questionam se é mais vantajoso ao Brasil desenvolver-se descolado de seus vizinhos da América do Sul ou integrado a eles. Quanto a esse aspecto merecem ser reproduzidas as sábias palavras do nosso veterano embaixador Baena Soares, quando este diz que “integrar é imperativo”. Não há dúvidas quanto aos benefícios econômicos, políticos e sociais decorrentes da integração. Em primeiro lugar, a segurança do continente é garantida, vez que é do interesse das partes o desenvolvimento das demais, não restando espaço para conflitos armados. Não obstante a isso, são patentes os benefícios comerciais aos países mercosulinos advindos do crescimento do comércio intra-bloco, decorrente da liberdade de circulação de mercadorias. Politicamente, o Cone Sul ganha visibilidade perante a sociedade internacional passando a representar um centro de poder independente dos Estados Unidos da América. Considerações merecem ser feitas acerca da influência que este país sempre exerceu sobre nosso continente, muitas vezes em processo contrário ao da integração regional. Desde o lançamento da Iniciativa para as Américas (IPA), proposta pelo presidente Bush em 1990, passando pela Área de Livre Comércio das Américas (ALCA), e posteriormente, com a paralisação das negociações desta, com as tentativas de firmar acordos bilaterais de livre comércio com países latino americanos, os Estados Unidos representaram eminente risco de dispersão entre os países do Cone Sul de seu processo integracionista. Destarte, observamos atualmente a existência do referido tipo de tratado bilateral entre aquele país e o Chile, a Colômbia e o Peru, só para citar alguns exemplos. Nesse contexto, a solidificação e expansão do MERCOSUL representam importantes conquistas para o continente. Destaca-se que até pouco tempo atrás o Uruguai cogitava a hipótese de se retirar do bloco a fim de celebrar tratados de livre comércio com os EUA. Dessa forma, constituiu importante vitória para a integração sul-americana a eleição do presidente José Pepe Mujica, cuja campanha eleitoral foi embasada na integração regional. Sua eleição representou, portanto, o fim dos dilemas uruguaios. O MERCOSUL se sobressai, portanto, como representante da vitória da integração sub-regional sobre a influência estadunidense.
A integração comporta aspectos políticos, econômicos e culturais. Nesse sentido, falta a nós o empenho necessário para a construção de uma identidade cultural sul-americana. Possuímos uma história em comum e, diferentemente das comunidades europeias, possuímos uma afinidade linguística excepcional, que em muito facilita nosso convívio. É necessário que cultivemos essa afinidade, em busca de uma integração que independe de vontade política, mas que também se constrói de maneira gradual e flexível. É imperativa a criação e fortificação de uma identidade mercosulina, afinal, como afirmara a respeito da Europa, Jean Monnet: “Nossa união não é de Estados, senão de pessoas.” Nesse sentido se faz de importância fundamental as parcerias entre faculdades e a incorporação de temas referentes ao MERCOSUL na agenda cultural, na mídia e nas áreas de produção de saber dos Estados Partes.
Vale ressaltar que as negociações no âmbito do MERCOSUL tem sido desde sua origem, predominantemente integrativas , de modo que os resultados tem apresentado ganhos relativos para todas as partes.
Muito se tem criticado o MERCOSUL pela ausência de supranacionalidade em suas instituições. De fato, o referido mecanismo regional caracteriza-se por seu aspecto eminentemente intergovernamental. Não há entre nós um órgão como a Comissão da Comunidade Europeia, de caráter evidentemente supranacional, os funcionários do MERCOSUL representam, em geral, seus respectivos países de origem, não sendo funcionários internacionais concursados, como ocorre na União Europeia, além da tomada de decisão dos órgãos ser por consenso, em prejuízo da decisão por maioria, característica do bloco supranacional europeu. O Brasil, desde a criação do mecanismo de integração americano, deixou clara sua posição a favor da intergovernamentabilidade, de sorte a manter hegemônica sua influência no bloco. Essa característica, portanto, não confere primazia ao direito comunitário, o que impõe a necessidade de internalização das normas mercosulinas, procedimento que por certo limita o poder de atuação das instituições, vez que não há aplicação imediata de tais normas. Em verdade, não há sequer que se falar em direito comunitário, senão em direito da integração. Apesar de todas essas críticas, possuímos na América Latina uma aceitação das diferenças que não é possível se observar em nenhum outro lugar do mundo. Pessoas de diferentes cores, origens, classe social e nível educacional compartilham o mesmo espaço físico de forma harmoniosa e natural, não obstante os evidentes problemas sociais existentes. Como alegar ser o modelo europeu de integração exemplar, se dentro de um único país, como a Espanha, observa-se a co-existência conflituosa de quatro diferentes línguas, com movimentos separatistas, rivalidades locais e outros fatores de desintegração? Sim, a Europa inovou, e deve servir de exemplo institucional. Inaugurou o direito comunitário, com a concessão, por parte dos Estados Membros, de parte de sua soberania às instituições do bloco supranacional, incumbindo à ciência política o trabalho de definir e dissecar esse novo modelo de integração regional. Contudo, a literatura que atrela o conceito de institucionalização e funcionalidade à supranacionalidade se revela eurocentrada e simplificadora. O Observatório Político Sul-Americano sugere outros critérios de institucionalização a serem utilizados que não o da autonomia, tais como adaptabilidade, complexidade e coesão, de sorte que o MERCOSUL em sua breve história, já mostrou sua capacidade de se adaptar a crises, de tornar mais complexas suas instituições e ampliar suas competências e a uniformizar seu posicionamento em foros internacionais. Tudo isso, somado a prioridade conferida aos respectivos governos no sentido da integração salientam a força do bloco, onde a cooperação tem prevalecido sobre o conflito.
Observa-se, portanto, em todas as partes do globo a emergência de blocos regionais definidores da nova ordem mundial e caracterizadores de um mundo multipolar, onde o poder se distribui entre os diferentes pólos regionais. É nesse contexto que os mecanismos de integração devem ser privilegiados, ressaltando-se, na América Latina, a UNASUL e o MERCOSUL. Devem ambos ser prioridade na agenda externa dos países latino-americanos. Nesse sentido é de grande valia a adesão da Venezuela a este mecanismo, bem como a possível futura adesão da Bolívia. Dentre os cinco países associados ao MERCOSUL, Bolívia, Equador, Colômbia, Peru e Chile, apenas os dois primeiros podem aderir ao bloco no presente momento, devido ao fato de que os outros três possuem acordos bilaterais de livre comércio com os Estados Unidos, de modo que uma adesão descaracterizaria a tarifa externa comum, e consequentemente a união aduaneira. Tal situação evidencia a remanescente influência estadunidense na região.
São patentes as grandes assimetrias existentes dentro do bloco. O PIB da Argentina, segundo maior da região é equivalente a 1/3 do PIB brasileiro. O Brasil é irrefragavelmente o país de maior influência econômica e política, possuindo a maior porcentagem da população, do território e das riquezas naturais da região. É devido a isso que cabe a nós sermos generosos com nossos vizinhos, a fim de formar uma união sul-americana forte e estável, política e economicamente, afinal, como já declararam inúmeras vezes o presidente Lula e o nosso chanceler Celso Amorin, o desenvolvimento dos nossos vizinhos e da região é do interesse direto do Brasil.




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Texto de Pedro Muniz Pinto Sloboda

sábado, 17 de abril de 2010

PARLAMENTO DO MERCOSUL

IMPORTÂNCIA


Atualmente, o parlamento tem caráter consultivo e faz recomendações ao conselho de mercado comum do bloco.

O Parlasul representa para a sociedade civil uma oportunidade de participação na consolidação de um espaço de articulação e integração regional.

Quando o Parlamento do Mercosul (Parlasul) foi criado, em 2006, já estava previsto, em seu Protocolo Constitutivo, que em 2011 todos os Estados Partes teriam seus representantes eleitos por voto direto, universal e secreto. A candidatura terá a duração de 4 anos. Para que esta determinação se concretizasse, cada país elegeria pela primeira vez seus parlamentares de acordo com as suas agendas eleitorais no período compreendido entre 31 de dezembro de 2006 e 31 de dezembro de 2010, quando conclui-se a primeira etapa de transição do Parlamento. O Paraguai elegeu seus primeiros representantes em 2008. Argentina e Uruguai elegerão em 2011, devido a alterações em seus calendários eleitorais.

O Brasil tem a escolha prevista para 2010, e com isso o Parlamento do Mercosul atingirá a maioridade representativa. Até então, os congressistas desses quatro países tinham sido escolhidos para compor o Parlamento do Mercosul por indicação dos respectivos Parlamentos nacionais.

AS ELEIÇÕES NO BRASIL

A eleição do Parlasul no Brasil está regulamentado no projeto de lei n°. 5279/2009. As eleições ocorreriam na mesma data das eleições para presidente, deputados e senadores. De acordo com o texto apresentado pela Comissão, os parlamentares serão eleitos pelo sistema proporcional por meio de listas preordenadas pelos partidos, sendo a circunscrição nacional. Os primeiros cinco nomes serão compostos por representantes das cinco regiões brasileiras, com intercalação por gênero. O mesmo se repete para os cinco nomes seguintes até o décimo nome. O candidato ao Parlasul não poderá concorrer a outro mandato eletivo federal ou estadual.

O Congresso brasileiro, mesmo com as atuais crises, tem a responsabilidade exclusiva de ajustar à legislação eleitoral a lei que regerá as eleições para o Parlasul.

Ademais, algumas organizações da sociedade civil também acompanharam este debate, e podem ser convidadas para compor a Comissão da suprapartidária, mesmo como observadoras. No sentido de efetivar o princípio da participação social nas decisões nacionais e internacionais, os governos estão agregando na formulação de seus programas lideranças sociais. Atentos a este princípio, o atual presidente da Representação Brasileira no Parlamento do MERCOSUL, deputado José Paulo Toffano (PV-SP), convidou algumas representações da sociedade civil para participar de algumas reuniões da Comissão Suprapartidária.

REPRESENTAÇÃO

Atualmente, o país tem 18 representantes: nove deputados e nove senadores, que dividem a atuação no Congresso e no Parlamento do Mercosul. Argentina, Paraguai e Uruguai também têm 18 representantes cada. O acordo político negociado em 2006 pelos integrantes do Mercosul previa que em 2011 todos os países teriam seus representantes eleitos por voto direto. O Brasil elegerá 37 parlamentares em 2010. Em 2011 a Argentina elegerá 26 parlamentares e o Uruguai, 18 parlamentares em 2011. O Paraguai foi o único que já elegeu 18 representantes. Segundo o Itamaraty, foi uma decisão unilateral daquele país, pois ainda há divergências sobre o número de representantes que cada país terá.

Apesar da agenda de eleições, uma questão que vem sendo alvo de grande disputa entre os países-membros do Parlamento do Mercosul é a idéia de que sejam feitas representações proporcionais de cada país, levando em conta a população de cada um, em vez de representações paritárias. A proposta de “proporcionalidade relativa” vem sendo defendida pelo Brasil. Para a sociedade civil, o caminho mais justo é o de manter a paridade, pelo menos enquanto forem tão acentuadas as assimetrias regionais.

Os Estados Partes do Mercosul decidiram-se, após várias negociações, pela implementação da proporcionalidade eleitoral, em duas etapas. Na primeira etapa, o Brasil deverá eleger 37 parlamentares, a Argentina 27, o Paraguai 18 e o Uruguai outros 18. Na segunda, a partir de 2014, todos os países membros do Mercosul deverão eleger seus representantes na mesma data, conforme previsto no Protocolo Constitutivo do Parlamento do Mercosul, no dia do Cidadão Mercosul. Serão eleitos 75 parlamentares brasileiros, 37 argentinos, 18 paraguaios e 18 uruguaios. A Venezuela, só elegerá seus representantes quando cumprir as exigências para se efetivar como membro pleno do Mercosul.

Nesta eleição do Parlasul, há uma justaposição entre eleições majoritárias e proporcionais. A característica de eleição majoritária dar-se-á pelo seu caráter nacional. A lista de candidatos será votada nacionalmente. Não se escolherá um candidato, mas uma lista. Porém, a lista que mais receber mais votos não será a vencedora, mas receberá as vagas proporcionais a sua votação. Os votos apenas indicarão a proporção de candidatos que ocuparão as vagas entre as 37 existentes. Se um partido obtiver 55% do total dos votos em nível nacional, receberá 20 cadeiras (55% de 37 cadeiras).

AS REGRAS ELEITORAIS

De acordo com o ante-projeto de lei, que deve ser votado até setembro deste ano pelo Congresso Nacional, as eleições para parlamentares brasileiros do Mercosul serão realizadas por lista pré-ordenada nacional. Elas acontecerão simultaneamente às eleições de presidente e vice-presidente da república e de senadores e deputados federais, estaduais e distritais. Ao todo serão eleitos 37 representantes do Brasil para o Parlamento regional.

O que é lista pré-ordenada nacional?

A eleição por lista pré-ordenada nacional significa que cada partido, ou coligação partidária, apresentará uma lista com os nomes dos seus candidatos na ordem pela qual eles serão eleitos. Dessa forma, se uma lista recebeu, no Brasil inteiro, voto suficiente para eleger cinco parlamentares, o cidadão sabe que serão os mesmos candidatos que ocupam os cinco primeiros lugares da mesma. Como ela é nacional, todos os eleitores do país terão as mesmas opções de listas. Na hora de votar o eleitor digitará na urna eletrônica o número do partido que ele escolheu. Caso a lista seja de uma coligação, o cidadão poderá digitar o número de qualquer um dos partidos que compõe a mesma.

Como será composta lista?

O ante-projeto de lei que está tramitando no Congresso Nacional prevê que cada partido, ou coligação partidária, poderá apresentar até 55 candidatos, ou seja, 150% das 37 vagas existentes para o Brasil no Parlamento do Mercosul. Os cinco primeiros lugares de cada lista devem trazer um representante de cada região do país, da mesma forma que os cinco candidatos seguintes. Esses dez primeiros nomes também deverão ser intercalados por gênero. As regras para a composição das demais vagas na lista serão definidas no estatuto de cada partido e os candidatos devem ser escolhidos por convenção nacional. Caso não exista um estatuto, o órgão decisório nacional do partido deverá publicar no Diário Oficial da União as normas que serão seguidas para indicar os candidatos.

Como funcionará a coligação partidária?

Os partidos, de acordo com o ante-projeto, poderão realizar coligações livremente para apresentarem seus candidatos ao Parlamento do Mercosul. Essas coligações não precisam ser as mesmas feitas para os demais cargos que também estarão sendo votados no mesmo dia.

O candidato ao Parlamento do Mercosul pode se candidatar a outro cargo?

Aquele que se apresentar como candidato ao Parlamento do Mercosul não poderá se candidatar a mais nenhum outro cargo eletivo das eleições de 2010. Ou seja, quem quer ser parlamentar brasileiro do Mercosul não pode concorrer a presidente da república, a vice-presidente da república, a senador ou a deputado federal, estadual ou distrital.

Quando um candidato é eleito?

Pelo ante-projeto de lei, os parlamentares do Mercosul serão eleitos pelo sistema proporcional, assim como nas eleições para deputados federais.

Como funcionará a propaganda eleitoral?

Para que o cidadão brasileiro entenda o que é o Mercosul e como funciona o Parlamento do bloco, o ante-projeto de lei prevê que o Tribunal Superior Eleitoral destinará dez minutos diários, divididos em blocos de 60 segundos, nas rádios e nos canais de televisão (tanto abertos como por assinatura) para difundir informações sobre os mesmos. Isso acontecerá nos 180 dias anteriores à propaganda eleitoral gratuita.

Nos 45 dias anteriores as eleições, ou seja em meados de agosto de 2010, as rádios e os canais de televisão (abertos ou por assinatura) transmitirão, de segunda a sábado, dez minutos diários de propaganda eleitoral gratuita das listas que concorrem a vagas no parlamento do Mercosul.

OBSTÁCULO

Há pouco envolvimento dos partidos na discussão sobre o Parlamento do Mercosul e até mesmo o autor do projeto está pessimista com a votação do texto até o fim deste mês pela Câmara e pelo Senado. Segundo Zarattini, há obstáculos, como o desinteresse de parlamentares do Congresso. De acordo com o senador Inácio Arruda (PCdoB-CE), vice-presidente da Representação da Brasileira no Mercosul, a paralisação da negociação sobre as regras dessa eleição se deu por conta de outro projeto que altera a Lei Eleitoral: a minirreforma eleitoral, ainda em tramitação no Congresso. As regras para as eleições gerais são prioridade, havendo um maior interesse por parte dos parlamentares.

A Constituição Brasileira preceitua, em seu artigo 16, que toda alteração nas legislações referentes às eleições devem ser aprovadas até um ano antes da realização das mesmas. Assim, se as próximas eleições acontecem no dia 3 de outubro de 2010, o Congresso Nacional teria até o final de setembro de 2009 para aprovar o projeto de lei, o que não ocorreu, apesar de deputados e senadores trabalharem em estado de urgência na elaboração de um ante-projeto de lei que regulamente as referidas eleições.

Neste sentido, como o projeto de lei ainda não foi aprovado (podendo sê-lo, pois a tramitação do projeto ocorre em caráter de urgência), deverá continuar o modelo atual: os partidos indicarão um parlamentar para integrar o Parlamento, sem dedicação exclusiva à função.

Ainda, há divergências no âmbito do Mercosul, pois muitos parlamentares preferem o atual sistema de indicação e, portanto, não querem a eleição direta pela população. Ademais, o Paraguai considera estar sub-representado e exigiu a criação de um Tribunal de Justiça Supranacional, para mediar controvérsias de decisões tomadas dentro do Parlamento.


CRÍTICA

Mas o que mais incomoda as lideranças sociais é que, da forma que se pretende organizar as eleições – isto é por meio de coligações de partidos – o eleitor votará em uma lista partidária, mas elegerá simultaneamente candidatos de outros partidos sem nenhuma identidade programática entre eles.

O anteprojeto permite os partidos celebrarem coligações livremente. As coligações em eleições proporcionais geram uma interferência nas diversas ideologias defendidas pelos partidos.

Nesse sentido, um eleitor de esquerda do Rio Grande do Sul a depender da coligação do seu partido, não terá opção: votará na sua sigla de preferência e poderá eleger um outro candidato desconhecido pelo eleitor.

Assim, imaginem uma coligação entre PT, PMDB e PTB: se Lula fosse o 1º nome da lista, provavelmente receberia votos suficientes em nível nacional para eleger a si e os próximos da coligação – por exemplo: Roseana Sarney (2º nome da lista) e Roberto Jefferson (3º nome da lista).